sábado, 18 de abril de 2009

Uma Homenagem:



Cartas guardadas



Ao descobrir a facilidade da Internet e a rapidez dos e-mails a criança pergunta ao avô o porquê das cartas ainda existirem. Perguntou justo ao avô, que tanto lutara para se readaptar às maravilhas da modernidade. Perguntou justo àquele senhor de barbas brancas, que sempre buscou as melhores explicações.

O avô ficou calado por um instante, então, abriu um sorriso, seus olhos brilharam com nostalgia e começou a falar:

__ Filho, houve uma época em que nada tinha tanta pressa. Isso fazia com que nós aproveitássemos cada momento. O momento da espera, o tempo entre uma ação e a sua resposta. Com as cartas dava tempo para imaginar as coisas: como a pessoa ia receber a carta, o que ela ia falar para quem estava ao seu lado,se ia ler no quarto sozinha, se ela ia experimentar cheirar a carta, para descobrir o perfume que estava ali... __ o velho sorriu mais umas vez, imerso em lembranças e continuou a narrar suas vivências __ E a resposta da carta? Ah, hehe, dava até uma coceira na mão para ver se o carteiro tinha trazido uma carta para você...

O menino ouviu atento, acompanhando a emoção com que o avô contava suas histórias, mas na verdade seus olhos ainda demonstravam ao avô sua incompreensão. Felizmente, o velho era paciente e gostava de falar.

__ É claro, existe um pouco disso através dos e-mails, mas é diferente, um pouco dessa magia se perdeu, meu filho. __ O avô continuou sua explicação, buscando misturar aquela realidade à do garoto. __ Com escrita cursiva você pode observar a força com que as palavras foram escritas, a rapidez ou a dedicação com que aquelas frases ganharam vida. Tudo era notado e tudo era válido desde o erro cuidadosamente apagado ou mesmo as lágrimas que borraram a tinta...

__ Ah, uma carta não é uma simples folha de papel não, as palavras ali escritas geram um valor sentimental, uma lembrança do carinho daquela pessoa. Por exemplo, quando você recebe um e-mail de um amigo,por mais que esse fique gravado, ele se perde quando o computador dá pau, ou quando é preciso aliviar a memória do HD. Já a carta, ah, essa persiste, ganha uma cor diferente com o tempo. Ela é relida dez anos depois, vista sob um outro ângulo, uma outra realidade. A carta torna a ser lida por uma visão mais consciente de si, mais calma e indolor.

O velho agora olhava para o nada, imerso em seus tempos de juventude. Muito mais jovem, com um bigode fino, sapatos lustrados, fazendo serenatas e cartas apaixonadas. Tudo era mais lento e importava mais. A carta era deixada por debaixo da porta e a canção anunciava as declarações apaixonadas...

__ Vô, você está bem?

__ Meu filho, escreva uma carta a uma pessoa querida, contando coisas de sua vida e lembrando de coisas boas vividas. Faça isso de modo que a pessoa queira e lhe deva uma resposta. Depois me diga o que sentiu ao enviar, ao esperar pela resposta e depois ao recebê-la.

Uma semana depois o avô recebeu uma bela carta.

2 comentários:

ouvidosmudos disse...

eheheheh
a descrição das razões da carta me lembrou demais o jeito de um certo guilherme de contar um causo! Atentando para cada detalhe da história e da reação do ouvinte!

Amanda Torreal Rosa disse...

Meu querido, as cartas por si só, quase demonstram os sentimentos daquele que as escreve... As letras trêmulas ou não, as dobraduras, marcas de lágrimas, canetas coloridas para expressar a alegria...

A internet é fácil, ágil, e me permite matar a saudade com mais rapidez... Mas cartas são cartas...