O avô ficou calado por um instante, então, abriu um sorriso, seus olhos brilharam com nostalgia e começou a falar:
__ Filho, houve uma época em que nada tinha tanta pressa. Isso fazia com que nós aproveitássemos cada momento. O momento da espera, o tempo entre uma ação e a sua resposta. Com as cartas dava tempo para imaginar as coisas: como a pessoa ia receber a carta, o que ela ia falar para quem estava ao seu lado,se ia ler no quarto sozinha, se ela ia experimentar cheirar a carta, para descobrir o perfume que estava ali... __ o velho sorriu mais umas vez, imerso em lembranças e continuou a narrar suas vivências __ E a resposta da carta? Ah, hehe, dava até uma coceira na mão para ver se o carteiro tinha trazido uma carta para você...
O menino ouviu atento, acompanhando a emoção com que o avô contava suas histórias, mas na verdade seus olhos ainda demonstravam ao avô sua incompreensão. Felizmente, o velho era paciente e gostava de falar.
__ É claro, existe um pouco disso através dos e-mails, mas é diferente, um pouco dessa magia se perdeu, meu filho. __ O avô continuou sua explicação, buscando misturar aquela realidade à do garoto. __ Com escrita cursiva você pode observar a força com que as palavras foram escritas, a rapidez ou a dedicação com que aquelas frases ganharam vida. Tudo era notado e tudo era válido desde o erro cuidadosamente apagado ou mesmo as lágrimas que borraram a tinta...
__ Ah, uma carta não é uma simples folha de papel não, as palavras ali escritas geram um valor sentimental, uma lembrança do carinho daquela pessoa. Por exemplo, quando você recebe um e-mail de um amigo,por mais que esse fique gravado, ele se perde quando o computador dá pau, ou quando é preciso aliviar a memória do HD. Já a carta, ah, essa persiste, ganha uma cor diferente com o tempo. Ela é relida dez anos depois, vista sob um outro ângulo, uma outra realidade. A carta torna a ser lida por uma visão mais consciente de si, mais calma e indolor.
O velho agora olhava para o nada, imerso em seus tempos de juventude. Muito mais jovem, com um bigode fino, sapatos lustrados, fazendo serenatas e cartas apaixonadas. Tudo era mais lento e importava mais. A carta era deixada por debaixo da porta e a canção anunciava as declarações apaixonadas...
__ Vô, você está bem?
__ Meu filho, escreva uma carta a uma pessoa querida, contando coisas de sua vida e lembrando de coisas boas vividas. Faça isso de modo que a pessoa queira e lhe deva uma resposta. Depois me diga o que sentiu ao enviar, ao esperar pela resposta e depois ao recebê-la.
Uma semana depois o avô recebeu uma bela carta.